Início » Analfabetismo social
Este Blog do Chiarella, que é dedicado a comentar sobre a Educação, especialmente de Santos, cidade onde moro e trabalho, também dá seus pitacos em outras searas, nem tão distantes do nosso tema central, mas que acabam por fugir um pouco da nossa linha. Aqui vai um deles. Temos visto, pelas estatísticas apresentadas por institutos de pesquisa e, também mostrados pela televisão, vários tipos de analfabetismo. Todos preocupantes, uns mais, outros menos, mas que nos levam a pensar no Brasil que deixaremos para os nossos filhos e netos. O analfabeto é aquele homem ou mulher que não sabe nem ler nem escrever um simples bilhete. Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua Educação, são 11 milhões de pessoas nessa condição.
Ser analfabeto não é ofensa. Essas pessoas não têm culpa dessa sofrida situação. Em número impreciso até mesmo pelas autoridades, esse segmento da sociedade simplesmente teve falta de oportunidade de estudar, de aprender ainda que sejam as letras básicas do abecedário e até mesmo simples contas de somar, comumente chamadas de contas de mais. Nem vou falar sobre subtração, multiplicação e divisão. O analfabeto não é excluído porque quer e sim pela falta de oportunidade, e a responsabilidade é de todos. E quando falo isso, essa afirmação passa, inclusive pelas nossas péssimas escolhas na hora de votar nos representantes na política em todas as esferas.
Essa importante parcela da população brasileira – cito o Brasil, mas existem analfabetos funcionais inclusive no Primeiro Mundo – formada pelos analfabetos, claro que preocupa bastante, mas o que me acende duplamente o sinal vermelho de alerta é o grupo denominado analfabetos funcionais. Esses, diferentemente dos primeiros, tiveram acesso à escola, de onde saíram e são, pelo menos tecnicamente, alfabetizados. No entanto, essa denominação de analfabeto funcional mostra pessoas que aprenderam a ler e a escrever, ainda que de forma precária, assinam o nome, mas não conseguem sequer interpretar um texto, muitas vezes básico. Isso é motivado pela falta de um projeto de Educação que tenha como tema central a base científica. De que adianta sermos um país com milhares de livros publicados se poucos conseguem ler e muito menos entender? Isso também tem a ver que, nos últimos anos, discursos não relacionados diretamente ao aprendizado, adquiriram mais importância para os governantes da esfera federal, estadual e especialmente a municipal, à qual eu, professor Chiarella, mais direciono minha atenção e minha reclamação.
Nos primeiros anos do aprendizado, conhecidos como o Ensino Básico, que engloba o Fundamental I e o Fundamental II, ambos sob a responsabilidade do prefeito de Santos, precisamos deixar de lado assuntos que tiram o foco do principal: ensinar. A Escola Básica merece atenção especial do Estado de São Paulo e do município de Santos, este especialmente nestes tempos de pandemia pela Covid-19 tem relegado os alunos e suas famílias. Desde que as aulas foram paralisadas e os professores se viram obrigados a, sem qualquer capacitação dada pela Prefeitura, preparar e ministrar aulas on line, os alunos da rede pública passaram a sofrer. Para boa parcela dos estudantes, a escola também é um local de refúgio. Ali, amparados pelos professores e ao lados dos colegas de classe, se socializam, estudam, recebem conhecimento, a merenda e se alimentam.
Nas suas casas, nesses meses todos sem frequentar as aulas, se viram abandonados educacionalmente, pois muitas famílias não tinham e nem têm condições de comprar dados das operadoras de celular para que os filhos pudessem acompanhar as aulas da maneira certa. Os que conseguiram enfrentaram quedas de sinais e constantes interrupções. Isso ajuda, e muito no aumento dos analfabetos funcionais, de gente que não consegue se expressar minimamente, não entende e nem compreende o que lê e escreve. E isso não é culpa dos professores, uma classe que, especialmente em Santos, trabalha sob péssimas condições, enfrenta salas superlotadas, recebe salários baixíssimos e nenhum reconhecimento por parte dos nossos governantes municipais. Geralmente eles são os últimos a serem ouvidos. Isso quando são ouvidos.
O terceiro analfabeto que gostaria de citar, afirmo que é o pior de todos: o analfabeto social. Temos acompanhado pelos veículos de comunicação, gente que se utiliza de seus cargos e de sua formação para achincalhar trabalhadores comuns. Todos conhecemos a famosa frase: Você sabe com quem está falando? Esses que as utilizam são formados em escolas particulares, fizeram boas faculdades, subiram nas carreiras, mas não conseguem respeitar as outras pessoas como deveriam. Esse grupo tem grande e boa formação profissional, mas é composto por inúmeros analfabetos sociais. Enquanto os dos outros dois segmentos ainda têm esperança de aprender e melhorar, este último tende somente a se tornar pior e pior.
José Roberto Chiarella, o professor Chiarella, é educador. Professor de Educação Física formado em 1986 e coordenador do Colégio Objetivo na Baixada Santista na cadeira de Direito e Cidadania e Formação para a Vida. Advogado com especialização em Direito Digital pelo Mackenzie e mestrado em Relações Internacionais Laborais pela Untref, na Argentina.